quarta-feira, 13 de maio de 2020

Os Algoritmos da Caixa de Pandora




O italiano Umberto Eco (1932-2016) dizia que as teorias das conspirações permearia, com abundância, o imaginário coletivo das novas gerações do século XXI, com a criação de realidades paralelas e fragmentadas. Será que o escritor de muitos livros, entre eles "O Nome da Rosa", está certo?
Durante a sua existência o simiólogo foi um assíduo combatente do fascismo. Entretanto, ele tinha uma leitura profunda sobre o que acontecia à sua volta, principalmente no território italiano.
Mas, mesmo envolto no seu habitat natural, Eco era um intelectual universal. Nos seus artigos, e até mesmo nos seus romances, as suas reflexões se articulam sobre um cenário planetário inverso ao das formulações do liberalismo clássico e do neoliberalismo.
O liberalismo clássico surgiu no século XVIII para ser, em tese, o condutor de uma economia compromissada com o progresso e o bem estar do povo, envolto num raciocínio iluminista de paz e prosperidade, pensados por Adam Smith (1723-1790) e John Locke (1632-1704), com as liberdades individuais respeitadas, porém, na prática, essa é uma teoria contraditória, poucas pessoas se beneficiaram com esse sistema. E há muitos fatos que comprovam esta história.
Já o neoliberalismo implementado no século XX, depois da Segunda Guerra Mundial, tentou colocar a economia nos trilhos, com uma releitura "romantizada" no passado, apoiando-se nas proposições da mínima interversão do estado na economia, orientadas por Milton Friedman (1912-2006). Uma ideia que também não obteve grandes resultados. O que se viu foi recrudescimento da exclusão e pouco investimento no potencial das pessoas.
Ao longo das décadas de 80, de 90 e início de 2000, todo o processo econômico planetário começa a fraquejar, com excessos de planos econômicos bizarros. Um deles foi a entrada de tecnocratas, uma espécie de CEO (Diretor Executivo) de vários governos europeus, com projetos voltados para a eficiência estatal, como se o estado fosse uma empresa privada. Resultado: os lobismo aumentou, e favoreceu as grandes corporações. Por sua vez, o povo ficou entregue à própria sorte.
Ao invés de estimular a inclusão, o fortalecimento econômico das pessoas, houve uma derrocada, com o aumento de milhões de desempregados, conflitos étnicos, corrupção de partidos de esquerda e de direita. E, obviamente, a maioria da população, nada satisfeita com isso, se sentiu traída pelos seus representantes. Na primeira década do século XXI, ódios e rancores ganhariam corpo e voz nas principais capitais do mundo. Todos queriam mudanças. Os panfletos eram enviados, através de celulares, para uma nova tribo que se inspirava em discursos autoritários.
No seu livro "Baudolino", lançado em 2000, Umberto Eco traz nas entrelinhas alguns elementos que provocam a nossa imaginação, tendo como pano de fundo os mitos, as aventuras e as explorações geográficas, com fortes enredos religiosos e políticos, quando cita o terror produzido pelos hunos brancos que avançam sobre as cidadelas e povoados, e eliminam todos o que encontram pela frente. É uma carnificina sangrenta. Seria os hunos brancos os novos donos dos algoritmos? Sedentos por mudanças? Mas, quais mudanças seriam estas?
Segundo o italiano Giuliano Da Empoli, que escreveu "Os engenheiros do caos: Como as fake news, as teorias da conspiração e os algoritmos estão sendo utilizados para disseminar ódio, medo e influenciar eleições", entramos numa fase civilizatória onde as ideologias passadas, não tem vez para esse grupo que comanda os algoritmos. Para essa turma, existe no presente um enredo filosófico diferente, voltado para uma tecnologia amparada por saberes mais específicos nas áreas da política, da educação, da cultura, da história e de outros temas.
Mas há algum gerenciador por traz disso? E onde ele se localiza? O produtor desta narrativa se chama Movimento 5 Estrelas. Ele tem residência na Itália onde fica a sede desta "Babilônia" pós-moderna, que abriu a "Caixa de Pandora", colocando a geopolítica ao avesso, com uma multidão entrincheirada nas principais plataformas da internet, em violentas discussões sem sentido, num lugar onde ninguém se entende. Mas o projeto de manipulação é esse.
Ao redesenhar a linguagem no Facebook, no Youtube e no Whatsapp, os romanos sob a coordenação de Davide Casaleggio, empresário e político italiano, que seguiu os passos do pai Gianroberto Casaleggio (1954-2016) co-fundador e presidente da Casaleggio Associati srl, uma empresa de publicação na internet, que presta consultoria em estratégias de rede e edita o blog de Beppe Grillo, se tornar o gestor de milhões avatares espalhados pelo mundo. Foi através dele que Bosonaro e Trump ganharam vida.
No mundo atual, principalmente com últimas experiências aplicadas pelos algarítmicos na Itália, na França, nos Estados Unidos, no Brasil e em outros países, a tendência é que os hunos brancos ganhem mais força, através de uma grande teia invisível de controle.
Estamos num mundo da desterritorialização do ser. Quaisquer investidas punitivas por parte do judiciário, de comissões de deputados e senadores, para apurar as origens e produção de fake news, são completamente sem sentido.
Será que a realidade se tornará mais sonâmbula, e se anulará nas incongruências de um tempo preso nas teias construídas pelos novos donos dos algorítimos? Ou, para a nossa felicidade doméstica, isso não passa de uma teoria conspiratória?
Creio que não! Acredito que os hunos existem e eles se tornam cada vez mais fortes, e não conseguimos compreender o quanto de inteligência há por traz disso, e quem mais está envolvido nesta história.

Pós-pandemia: um futuro de humanos/máquinas

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